terça-feira, 25 de agosto de 2015

– Fui dormir e acordei tão ansiosa. Já fiz até uns exercícios de respiração 
– Mas por que a ansiedade?
– Pela vida...

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Cotidiano

[baseado em fatos reais]
O cobrador está sempre na primeira vez da linha e não conhece as paradas. O dentista costuma fazer questões complexas logo após enfiar sugador, algodão e mais algum aparelho que poderia ser de tortura na boca do paciente. O jornalista reclama de quase tudo e opina sobre algo que não sabe com profundidade. O dentista se apaixona pelo sorriso grande com 36 dentes bem cuidados e perfeitos do paciente. Um cobrador virgem que nunca saiu do seu bairro é cooptado por uma maria catraca que cede bom dias calorosos, usa decotes vistosos e ajuda a passar o tempo da viagem dividindo o fone de ouvido e mensagens personalizadas no Whatsapp. O jornalista, coitado, só tem tempo de paquerar no café a repórter de cultura, com seu cabelo modernoso e roupas estilosas. Mas nem conhece ópera, nem teatro, nem cinema profundamente. Será que ela vai perceber que ele é uma fraude? Nada, bobo, ela também é! 

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Tipos brasileiros: o eloquente da sala de aula

Preenche os silêncios com colocações. Conta histórias intermináveis sobre experiências pessoais. É autorreferente. Completa os pensamentos do professor, discorda ou concorda com teses apresentadas só para poder fazer colocações em cima das falas dele ou dos colegas. “Deixa eu só dizer uma coisinha...”, interrompe, só para fazer uma ‘contribuição’ de cinco minutos. Geralmente tem sotaque diferente do local em que está assistindo a aula, marcando sua fala e tornando-a mais sui generis.

Cria bordões próprios como deixa para voltar a atenção para si e dar exemplos do que vai sendo explanado. Não tem lead e conta histórias compridas: “quando eu tinha 14 anos...”. Mesmo diante dos olhares de tédio, raiva, impaciência ou da desatenção dos colegas segue falando, falando... Usa a sala como terapia, se descobre, se revela, completa carências, faz os colegas refém dos seus causos e experiências banais que ninguém tem interesse.


No fundo só quer ser aceito, só quer ser querido e amado... Sua pseudo-inteligência vai parecendo a cada dia mais fatigante e expoente da falta de amigos, conhecimento real e autoestima.  Em alguns casos funciona como paquita, ajudante de palco do professor, auxiliando a ligar aparelhos eletrônicos, o ar-condicionado, fecha a porta, pega um material... É hiperativo e interativo. Comenta a aula em tempo real, cria hashtags e subtemas relacionados. Haja repertório! Identificou a figura? Boa volta as aulas!

(Esse texto é baseado em diferentes pessoas que fizeram cursos comigo nos últimos anos. maio de 2014)


O eloquente da sala de aula é (potencialmente), já foi ou será o louco da palestra.

Entre Aspas: Eu estava prodigiosamente embriagado de mim mesmo. Eu, eu eu, eu. Nelson Rodrigues.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

2014: o ano relatos selvagens

O ano do cavalo, ou o ano relatos selvagens: correu como poucos, carregou fardos pesados, foi difícil, engraçado, tenso, denso, intenso, com histórias que pareciam inverossímeis, casos de reviravolta de vida em poucos segundos, com casórios, nascimentos, separação de casais, realização de sonhos antigos...

Um roteiro para ninguém botar defeito e após o qual não seremos mais os mesmos. Mas como todo filme de drama/suspense é bom também quando acaba e dá lugar para outras histórias. Que venha 2015, que traga as mudanças dos anos ímpares, que seja leve, e que tenha as características da ovelha (do ano chinês), mais calma e ordeira. É talvez esteja querendo uma comédia romântica mais água com açúcar, por que não?! ‪#‎felizanonovo‬

Dúvida do ano: veneno vencido faz mais ou menos efeito?

Entre aspas: Eu continuava febril de sonho. Mas o prato estava diante de mim. O bife era a vida real. Nelson Rodrigues.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

De vida e de morte

A vida é repleta de perigos. Numa casa, certamente, mal assombrada como essa, eles vêm de toda parte. Há mais mortos do que vivos por aqui. Os últimos resistentes também se aproximam do fim da vida.

A casa grande é aterrorizada silenciosamente pelos perigos. É a árvore que destrói a grossa parede de concreto. A umidade que corrói a pintura. As rachaduras que consomem o chão. As teias de aranha que tomam conta do pedaço. As mangas que se estabefam no telhado de zinco – provocando estrondos – e caem vigorosamente no chão, ameaçando o teto e a cabeça das pessoas. O gato que passa preguiçoso entre as pernas perigando derrubar os velhos que se arrastam pelo casarão.

Os azulejos soltam, os fios despencam, a máquina de lavar foi levada para o conserto e não voltou... Os besouros monstruosos sobrevoando ameaçadores. Sapos gigantes que coaxam e tentam devorar os mosquitos proporcionalmente grandes. A modernidade que avança sem olhar para trás. As perdas subjetivas, materiais e psicológicas que convivem todas juntas no mesmo espaço.

Mas o maior perigo mesmo é algo anunciado e, teoricamente, natural: a vida que se encaminha para a morte.


[23-12-2013]



Entre Aspas: A morte estava no ar e repito: – difusa, volatilizada, atmosférica; todos a respiravam. Nelson Rodrigues.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Pergunta pertinente aos casais

- Você acha que muitas vezes gostamos mais do relacionamento do que da pessoa com quem nos relacionamos?

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

2013 de ousadia


O ano começou nas margens do Rio Tapajós, em Alter do Chá (PA), numa das festas mais incríveis que já fui num reveillon. A música da virada foi “Eu vou navegar, nas ondas do mar, eu vou...Todo mundo nessa cidade é de Oxum...”. Era um anúncio. Além dos clássicos, saúde, paz e etc, eu desejava para os amigos “ousadia”. Para mim, queria um ano calmo, de águas serenas, melhorias e aprendizados continuando onde estava. Mas não foi nada disso que aconteceu. 

Por conta de um plantão jornalístico, passei meu primeiro carnaval em São Paulo. E não morri. Conheci uma pessoa que marcaria aquele ano. A Semana Santa foi em Campo Grande, ao lado da minha mãe que tinha feito uma cirurgia. Perdi um voo por conta do trânsito das marginais paulistanas, dormi no aeroporto - no chão de Cumbica, para ser mais exato.

Maio foi um mês especial. De me apaixonar e de me permitir viver esse sentimento, mesmo sabendo da insanidade que ele anunciava. Fui demitido uma semana antes daquela que seriam minhas primeiras férias em nove anos de jornalismo. Ia estudar inglês em Londres.

Em junho parti do mesmo jeito para a “Gringa”. Nunca mais voltei, não o mesmo. Com o jornalismo derretendo pelas bandas de cá (além do Valor – onde eu trabalhava – Folha e Estadão demitiam e Abril fechava revistas), e o mundo se abrindo pelas bandas de lá, resolvi ficar mais dois meses. A decisão ocorreu no protesto de brasileiros pela diminuição da passagem em São Paulo, que ocorreu em Londres em 18 de junho. No meio de tantos brasileiros, com histórias parecidas com a minha, me senti em casa e vontade de continuar estranhando e estrangeiro nas terras da rainha. Navega por águas turbulentas.
Conheci algumas cidades europeias (destaque para Paris, Amsterdã e Edimburg), mas voltei sabendo mais sobre mim mesmo. Coisas que eu nem imaginava. Amadureci uns cinco anos em três. Entendi (ou relembrei com mais força) o que é sentir dor de saudade. A paixão de maio, a essa altura, esmagava meu peito. Voltei para vivê-la. E foi intenso. A lua de mel (como todas¿) durou pouco. Logo vieram tantas brigas, discussões e disputas de espaços que nem tive tempo de me reencontrar comigo mesmo.

Recusei trabalhos fixos que não tinham a ver comigo, para viver emendando de mês em mês meu contrato de freela na redação. Trabalhei como gente grande em freelas diversos e me alegrei por ainda poder ser jornalista. Vi o mar mais uma vez e o ano se aproximava do fim. 

Passei o Natal em Porto Murtinho relembrando quem eu era, de “onde eu tinha vindo” e preocupado com os meus que envelheciam 'sem medo da morte'. Segui para Assunção, no Paraguai, da maneira mais rústica, de barco, mini-ônibus e ônibus. O ano terminou nos braços amados, numa cama de hotel, ouvindo fogos que anunciavam 2014, numa cidade que parece parada na década de 80. Foi bom, foi intenso e profundo.